Foi aplicada ao caso a teoria do risco, a qual prevê que a atividade de transporte de valores, por si só, implica perigo e riscos à segurança e à vida do empregado.
A Brink’s Segurança e Transporte de Valores Ltda. deverá pagar indenização por danos morais, materiais e estéticos a um vigilante que, durante um assalto ao carro-forte em que trabalhava, foi alvejado por um tiro e ficou com o projétil alojado na cabeça sem possibilidade de remoção. A 5ª Turma do TST restabeleceu sentença de 1º Grau, que fixou a indenização em R$ 130 mil.
O assalto ao carro-forte, que transportava R$ 1 milhão, ocorreu em outubro de 2005, na rodovia que liga as cidades de Uberaba e Uberlândia (MG). Os assaltantes armados com fuzis atiraram no veículo e o vigilante foi atingido na cabeça por uma bala que não pôde ser removida, pois uma intervenção cirúrgica poderia causar a sua morte. Outros colegas também foram atingidos. As lesões e suas consequências foram confirmadas por laudo médico: o vigilante passou a apresentar "quadro clinico neurológico de hemiparesia à esquerda" e não tinha condições de retornar a suas atividades.
Em sua defesa, a transportadora alegou falta de culpa no evento. Afirmou que o assalto foi praticado por integrantes do crime organizado. Relatou que o carro-forte foi interceptado, à luz do dia, em uma rodovia movimentada, por uma S-10, com cinco assaltantes. Os bandidos, utilizando uma metralhadora automática, de 58 quilos, com capacidade para 600 tiros por minuto e alcance de 7 km, dispararam contra o carro-forte, obrigando-o a parar. Algumas balas transfixaram o carro blindado, e um estilhaço atingiu o trabalhador na cabeça.
A Brinks descreveu em sua defesa a organização dos criminosos: enquanto dois recolhiam o dinheiro do carro-forte, outros dois interromperam o trânsito e o último, munido de um cronômetro, controlava o tempo da ação. Após recolherem o dinheiro, os bandidos explodiram o carro-forte. O veículo utilizado no assalto foi encontrado logo depois, já incendiado, impossibilitando a coleta de digitais. Ainda de acordo com a empresa, diante de uma ação de tamanho vulto, não havia como impedir ou prever o ato criminoso, tratando-se, portanto, de caso fortuito ou força maior, sem dolo ou culpa da transportadora.
Além disso, destacou que prestou toda a assistência ao trabalhador acidentado. Apresentou notas fiscais que comprovaram gastos de R$ 24 mil com remédios, R$ 8 mil com hidroterapia, R$ 2,5 mil com fisioterapia, R$ 5 mil com psicoterapia e R$ 9,7 mil com despesas de deslocamentos. Também disse que o vigilante já havia recebido R$ 100 mil referentes às duas apólices de seguro contratadas pela empresa.
A sentença da Vara do Trabalho de Uberlândia (MG) foi parcialmente favorável ao trabalhador, embora a juíza tenha entendido que não houve culpa ou dolo da empresa. Segundo ela, o vigilante era qualificado para a função, participou de reciclagem e de curso de aperfeiçoamento, utilizava colete à prova de balas no momento do acidente e a blindagem do veículo estava em perfeitas condições de uso, não se apurando o descumprimento de qualquer norma de segurança pela empresa. A magistrada, no entanto, aplicou ao caso a disposição contida no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, que trata da responsabilidade objetiva (dever de indenizar, independentemente de culpa, considerando o risco da atividade). A empresa foi condenada a pagar R$ 80 mil por danos morais, R$ 50 por danos estéticos, mais pensão mensal ao trabalhador.
A empresa recorreu, com sucesso, ao TRT3. Segundo o Tribunal, a lei estabelece que o dever de indenizar cabe ao autor do dano, que, no caso, seriam os bandidos que atacaram o carro-forte. "O dano causado ao vigilante resultou da ação de terceiros, não havendo qualquer prova no sentido de que a empresa tivesse contribuído para sua ocorrência". Assim, a Brink’s foi absolvida da condenação imposta.
Ao recorrer ao TST, o vigilante pediu o restabelecimento da sentença. Fundamentou o pedido no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, afirmando que, em caso de atividade de risco, a responsabilidade da empresa é objetiva (teoria do risco).
A relatora do caso, ministra Kátia Arruda, observou que o dispositivo legal apontado como violado pelo vigilante prevê a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. "Com isso, a natureza da atividade refere-se àquela que, pelas características dos meios utilizados, tem grande possibilidade de provocar o dano, em razão de sua potencialidade ofensiva", assinalou.
Além do risco inerente à atividade de transporte de valores, a magistrada destacou ter ficado cabalmente demonstrado o dano. "O dano da atividade de risco recairá, sempre, ou no seu causador ou na vítima, e é forçoso reconhecer que é injusto que o prejudicado seja aquele que não teve como evitá-lo", concluiu. Assim, uma vez demonstrado o nexo de causalidade e a comprovação do dano, considerou não ser necessária a demonstração de dolo ou culpa da empresa.
Nº. do processo: RR 120740-23.2007-134-03-40.0
Fonte: TST
Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759