|   Jornal da Ordem Edição 4.319 - Editado em Porto Alegre em 14.06.2024 pela Comunicação Social da OAB/RS
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NOTÍCIA

22.07.11  |  Trabalhista   

Trabalhador obrigado a se despir em revista será indenizado

Um funcionário foi contratado em setembro de 2004 por um supermercado na cidade litorânea de Peruíbe, para prestar serviços como operador de computador. Entretanto, em outubro de 2007, foi dispensado pelo estabelecimento, que justificou que a extinção contratual ocorreu devido a pedido de demissão pelo trabalhador por ter obtido "êxito em concurso e relegou o trabalho junto a reclamada". Porém, o supermercado não conseguiu provar a demissão voluntária, "uma vez que a prova testemunhal não soube informar sobre o motivo da dispensa".

O Juízo da Vara do Trabalho de Itanhaém reconheceu o término do contrato de trabalho por iniciativa do próprio empregador, justificando o deferimento das verbas pedidas pelo reclamante. O trabalhador, então, moveu ação por danos morais contra o supermercado.

O funcionário conta que, em agosto de 2006, foi acusado com mais três empregados (entre eles, o filho do proprietário) de ter se apropriado indevidamente da quantia de R$ 3.230. A direção do estabelecimento levou todos para um quarto, onde o reclamante foi submetido à revista pessoal, "sendo obrigado a se despir, ficando apenas com roupa íntima, em situação constrangedora e vexatória diante dos colegas de trabalho".

A primeira testemunha do supermercado confirmou que foi imputada ao reclamante a autoria do delito relativo à apropriação do dinheiro do caixa, e afirmou que "os 4 funcionários foram responsabilizados pelo sumiço do dinheiro", inclusive o próprio reclamante, e "chegaram a ir para a delegacia".

No entanto, a testemunha do trabalhador, uma mulher que foi uma das acusadas do delito, disse que "saiu da sala no momento em os outros três foram revistados, chegando a ouvir o gerente dizer para eles tirarem a camisa e abaixarem as calças".

Além disso, uma segunda testemunha do supermercado confirmou que "os três, inclusive o reclamante, foi quem ‘agitou’. Na hora, entraram em consenso que teriam que ser revistados e de fato foram; que somente levantaram as roupas não ficando de roupas íntimas; que os próprios funcionários se revistaram".

O trabalhador comunicou o fato à autoridade policial e registrou boletim de ocorrência sob o título de constrangimento ilegal. Ele diz que, "além da humilhação sofrida, houve atraso no pagamento de seu salário por 15 dias, o que provocou a inclusão de seu nome nos serviços de proteção ao crédito". Ressalta, ainda, que o valor em questão foi dividido entre os quatro acusados e descontado em dez parcelas.

A empresa se defendeu alegando que, o montante desaparecido correspondia à ‘sangria’ do caixa, "sendo solicitada a presença dos empregados do setor, os quais nada esclareceram sobre o ocorrido". Porém, a empresa negou que tenha feito revista pessoal ou que o reclamante tenha se despido. Também negou ter imputado a autoria do delito a ele.

Inconformado, o funcionário pediu na Justiça do Trabalho indenização por dano moral no valor de 500 salários mínimos. A sentença reconheceu que o comportamento do empregador foi ‘abusivo’, "seja em razão da revista pessoal efetivada de forma vexatória, seja em razão da acusação pela prática do delito, sem qualquer prova de autoria", e arbitrou em R$ 15 mil a indenização por dano moral, ressaltando que "o valor pretendido pelo obreiro (500 salários mínimos) mostra-se excessivo e desproporcional ao dano sofrido".

O estabelecimento comercial recorreu, pretendendo a reforma da sentença que deferiu a indenização por dano moral, sustentando que "o reclamante não sofreu constrangimento". Para a relatora da 5ª Câmara do TRT, desembargadora Maria Madalena de Oliveira, "a discussão cinge-se à possibilidade ou não de o empregador, por possuir o direito de propriedade, realizar revista pessoal em seus empregados". Ela destaca que em tais casos, há "um conflito entre dois direitos fundamentais, quais sejam: direito à intimidade versus direito à propriedade, ambos assegurados pelo artigo 5º, da Carta Política, incisos X e XXII, respectivamente".

O acórdão apresentou uma vasta relação de métodos de interpretação, bem como determinados princípios específicos de interpretação constitucional, porém, para extinguir a questão relativa à colisão de direitos fundamentais, valeu-se do princípio da unidade da Constituição, segundo o qual: "o texto de uma Constituição deve ser interpretado de forma a evitar contradições (antinomias) entre suas normas e, sobretudo, entre os princípios constitucionalmente estabelecidos. O princípio da unidade obriga o intérprete a considerar a Constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar".

A decisão salientou que "para a dissolução do conflito, necessariamente, um direito irá prevalecer sobre o outro". E num "juízo de ponderação para que se verifique qual direito deve prevalecer", ressaltou que "o poder diretivo e fiscalizador do empregador assegurado pela CLT, artigo 2º, não é ilimitado, há de ser moderado e exercido sem abusos para com a pessoa do empregado, pois ele não retira do trabalhador a sua condição de cidadão, possuidor de direitos, dentre eles, o de ser respeitado na sua intimidade e vida privada".

O acórdão também reconheceu que "a revista pessoal no ambiente de trabalho encontra limites em nosso ordenamento jurídico, porque não se tolera a prática de atos que violem os direitos da personalidade dos empregados, apesar de não existir unanimidade acerca dessa matéria em nossos tribunais". Na hipótese dos autos, configurou-se "a prática de ato ilícito por parte da reclamada em total desrespeito à privacidade e à intimidade do trabalhador".

A decisão salientou ainda que "nos dias atuais, diante do avanço tecnológico, o empregador possui meios para proteger seu patrimônio de maneira mais apropriada, adequada, a custo relativamente baixo, sem constranger seus trabalhadores". Como exemplo, citou "o monitoramento visual, quer o realizado por câmeras de vídeo (filmagens por meio de circuito interno) ou através de vidros espelhados, desde que não posicionados em locais efetivamente reservados à intimidade dos empregados, com prévia ciência dos trabalhadores e observado o sigilo das imagens".

Em conclusão, o acórdão negou provimento ao recurso do supermercado e manteve o valor arbitrado na origem a título de reparação por dano moral, R$ 15 mil, "considerando a lesão, a intensidade do sofrimento e as demais circunstâncias pessoais e econômicas emergentes dos autos".

(Processo: 0105400-22.2007.5.15.0064)



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Fonte: TRT15

Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759

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