|   Jornal da Ordem Edição 4.295 - Editado em Porto Alegre em 10.05.2024 pela Comunicação Social da OAB/RS
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NOTÍCIA

25.10.11  |  Dano Moral   

Trabalhador brasileiro discriminado por reclamada na Espanha conquista indenização por dano moral

O empregado foi contratado ainda no Brasil, por um valor salarial. Chegando ao país, as promessas da empresa não foram cumpridas, pois o reclamante acabou sendo contratado como estagiário e com um salário muito abaixo do combinado.

Segundo ele, em reunião realizada em dezembro de 2003, no Brasil, ficou acertado que o salário seria de 2.049 euros. Mas as promessas feitas pelas reclamadas não foram cumpridas, a começar pela função – o reclamante acabou contratado como estagiário – e pelo salário, que não passou de 1.777,77 euros, afirmou o trabalhador. Para completar, o contrato, previsto para durar um ano, a partir de 5 de fevereiro de 2004, foi rescindido sem justa causa mais de dois meses antes, em 24 de novembro daquele ano.

Por unanimidade, a 1ª Câmara do TRT da 15ª Região reformou parcialmente sentença da 3ª Vara do Trabalho de São José dos Campos, para dar provimento a recurso ordinário de um trabalhador que, já em solo estrangeiro, na Espanha, foi contratado como estagiário e recebeu salários em valor inferior ao proposto em reunião ocorrida anteriormente no Brasil. No entendimento do colegiado, o reclamante sofreu "dano inequívoco a sua honra e reputação", conforme sublinhou em seu voto a relatora do acórdão, desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani. Assim, a Câmara condenou as empresas a pagarem ao autor da ação "uma indenização compensatória do dano moral provocado pelo abuso do poder diretivo patronal", no valor de R$ 40 mil.

O colegiado reformou a sentença original também no que diz respeito à aplicação da legislação brasileira ao caso, incluindo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). "Quando brasileiro trabalha no exterior, a relação jurídica é regida pela lei material vigente no país da prestação de serviços e também pelas normas estabelecidas nas Convenções Internacionais pela OIT", ponderou a relatora, calcada na Súmula 207 do TST. Assim, foram excluídas da condenação as obrigações de fazer referentes à anotação do contrato de trabalho na CTPS do reclamante e à entrega das guias para o levantamento do fundo de garantia do tempo de serviço, além dos próprios depósitos do FGTS e dos recolhimentos previdenciários.

A Câmara afastou ainda a condenação prevista no artigo 479 da CLT, o qual obriga o empregador a pagar ao empregado contratado por prazo determinado e demitido sem justa causa antes do final do contrato, a título de indenização, a metade da remuneração a que o trabalhador teria direito até o término inicialmente previsto para a relação de emprego. O reclamante provou, no entanto, fazer jus ao pagamento de diferenças da indenização devida pela rescisão antecipada do contrato, mas nos termos da legislação espanhola, e considerado o salário negociado no Brasil. Quanto ao intervalo intrajornada, a condenação foi limitada a 30 minutos diários, excluído o adicional de 50%. Foi determinado ainda o pagamento de férias proporcionais em conformidade com os critérios estabelecidos na Convenção 132 da OIT, com a dedução dos valores pagos a título de "parte proporcional vacaciones", de acordo com o que constou no termo de rescisão contratual juntado aos autos.

Entenda o caso

O reclamante, por intermédio da primeira reclamada, uma cooperativa de serviços, recebeu proposta da segunda ré – empresa do ramo de componentes aeronáuticos e aeroespaciais – para trabalhar na Espanha, onde exerceria a função de chapeador. Segundo ele, em reunião realizada em dezembro de 2003, no Brasil, ficou acertado que o salário seria de 2.049 euros. Mas as promessas feitas pelas reclamadas não foram cumpridas, a começar pela função – o reclamante acabou contratado como estagiário – e pelo salário, que não passou de 1.777,77 euros, afirmou o trabalhador. Para completar, o contrato, previsto para durar um ano, a partir de 5 de fevereiro de 2004, foi rescindido sem justa causa mais de dois meses antes, em 24 de novembro daquele ano.
Disse ainda o reclamante que, durante o período em que permaneceu na Espanha, sofreu várias lesões caracterizadoras de danos morais, cumpriu jornada excessiva sem recebimento de horas extras, gozou de apenas 20 minutos diários para descanso e refeição e não recebeu férias e verbas rescisórias.

Em seu recurso, a terceira reclamada, empresa brasileira do mesmo ramo da segunda ré e pertencente ao grupo econômico do qual esta faz parte, arguiu preliminarmente a incompetência da Justiça do Trabalho brasileira para processar e julgar a ação. Todavia, em que pese o fato de o contrato de trabalho ter sido firmado e cumprido na Espanha atrair a aplicação da legislação material espanhola, "não afasta a competência da Justiça brasileira para conhecer e julgar a presente ação, nem, por consequência, a aplicação da lei processual brasileira, pois a orientação jurisprudencial constante da Súmula 207 do C. TST refere-se apenas à lei material", lecionou a desembargadora Tereza Asta. "Trata-se de cidadão brasileiro, que bate às portas desta Justiça Especializada alegando ter sofrido lesão em seus direitos trabalhistas. A preservação da efetividade do processo, como ferramenta institucional apta a garantir a reparação da lesão sofrida por cidadão brasileiro, legitima e justifica a aplicação do sistema jurídico processual brasileiro em conformidade com o disposto nos artigos 1º, 5º – inciso XXXV – e 114 da Constituição Federal de 1988", reagiu a relatora, rejeitando a exceção de incompetência.

Sobre a aplicação da legislação brasileira ao caso, contestada pela segunda e pela terceira reclamada em seus recursos, melhor sorte tiveram as recorrentes. "Restou incontroverso nos autos que a proposta foi apresentada no Brasil a um grupo de trabalhadores, entre eles o reclamante, mas a efetiva celebração do contrato e a prestação de serviços ocorreram somente em território espanhol, atraindo a aplicação da Súmula 207 do C. TST, que agasalhou o critério da lex loci executionis, assim considerando aplicável a lei material do lugar da prestação de serviços, com espeque no artigo 198 do Código Bustamante, ratificado pelo Brasil – Decreto 18.671, de 1929, norma que, por ser especial, prevalece sobre o critério genérico previsto no artigo 9º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (anteriormente denominada Lei de Introdução ao Código Civil)", esclareceu Tereza Asta.

Afastada a aplicação da CLT, por consequência a Câmara decidiu reformar a sentença de 1ª instância no que diz respeito à condenação das empresas à anotação do contrato de trabalho na CTPS do reclamante e ao pagamento da multa prevista no artigo 479 da Consolidação, das férias proporcionais acrescidas de um terço e do 13º salário proporcional, por não constarem da legislação espanhola. Também foram excluídos o FGTS e os recolhimentos previdenciários, uma vez que foi igualmente afastada a aplicação das Leis brasileiras 8.036/90 e 8.212/91, respectivamente.

Já outra argumentação das empresas recorrentes, de que o salário mencionado na reunião realizada no Brasil tratava-se apenas de uma referência, não convenceu a relatora ou os demais magistrados que participaram do julgamento. Além de nos recibos juntados aos autos constar o valor de 1.777,77 euros para a remuneração mensal, a testemunha apresentada pelo reclamante afirmou – e não houve prova em contrário por parte das reclamadas, especificou a relatora – que o salário pago na Espanha era, de fato, inferior ao prometido no Brasil. Assim, a Câmara manteve a condenação quanto ao pagamento de diferenças salariais, mas com base no artigo 4º do Real Decreto Legislativo 1/1995 (legislação espanhola), e não na CLT, como decidira o juízo da 3ª VT de São José dos Campos.

No que se refere ao pedido de indenização por ter ocorrido rescisão antecipada do contrato por prazo determinado, a segunda reclamada admitiu expressamente que se tratava de contratação nesses moldes, o que foi confirmado também pela testemunha do autor, observou a desembargadora Tereza Asta. "As normas legais espanholas acostadas aos autos demonstram a estipulação, em tais casos, de uma indenização de 45 dias", ressaltou a relatora, e, com efeito, a segunda reclamada demonstrou que foi paga, na rescisão contratual, uma verba a esse título, sob a denominação de "finiquito". Mas o valor pago levou em conta, detalhou a magistrada, o salário efetivamente cumprido na Espanha, e não o que foi tratado no Brasil. "Assim sendo, decido afastar a condenação lastreada no artigo 479 da CLT e determinar o pagamento de diferenças da indenização devida pela rescisão antecipada do contrato a termo, para tanto considerando o período de 45 dias e o valor do salário estabelecido em 2.049 euros", votou a relatora, sendo mais uma vez acompanhada pelos demais julgadores.

Sobre as férias, a Câmara decidiu conceder ao trabalhador o direito a recebê-las proporcionalmente, segundo os critérios estabelecidos na Convenção 132 da OIT, ratificada pela Espanha em 30 de junho de 1972, com a dedução dos valores pagos a título de "parte proporcional vacaciones", conforme consta na rescisão contratual. O artigo 3º da Convenção fixa, entre outros aspectos, que as férias anuais não podem ter duração inferior a três semanas, e o artigo 4º estabelece que, no caso de não completar um ano de serviço, ainda assim o trabalhador terá direito a férias, mas de forma proporcional ao tempo trabalhado.

Em relação aos intervalos para refeição e descanso, o acórdão observou que a primeira reclamada não impugnou a jornada de trabalho alegada pelo reclamante, ao passo que as outras duas reconheceram que "na Espanha é autorizado o descanso intrajornada de até quatro horas" e não contestaram a alegação do autor, de que havia previsão contratual da concessão de 50 minutos para esse fim e que somente 20 minutos eram usufruídos. Ao contrário, as afirmações do reclamante foram mais uma vez confirmadas pela prova testemunhal. Até mais: segundo a testemunha, eram apenas 15 os minutos de intervalo. Apesar de não ter havido, por parte das reclamadas, contraprova dessa afirmação, prevaleceu o que fora dito pelo próprio reclamante, resultando, então, no entendimento da Câmara, que ao trabalhador são devidos 30 minutos diários a título de parte não usufruída do intervalo intrajornada, excluído, no entanto, o adicional de 50%, previsto no artigo 71, parágrafo 4º, da CLT, mas não na legislação espanhola.

Dano moral

O reclamante recorreu em relação a não condenação das empresas a pagar indenização por danos morais. O trabalhador alegou ter sofrido humilhações, discriminações e constrangimentos durante o período em que trabalhou na Espanha. Segundo ele, a segunda reclamada discrimina

 

Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759

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