O artigo questionado no recurso é uma norma de transição, e caso alguém tenha agido com dolo ou culpa na contratação do servidor, ele responderá regressivamente nos próprios termos do art. 37 da Constituição Federal.
Foi reconhecido o direito aos depósitos do FGTS aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a administração pública declarado nulo em função de inobservância da regra constitucional que estabelece prévia aprovação em concurso público. O entendimento é do STF.
A decisão foi tomada na continuação do julgamento do Recurso Extraordinário 596478, interposto pelo Estado de Rondônia, com a participação de vários outros estados como amici curiae, contra uma decisão do TST que reconheceu o direito ao FGTS. Por maioria, o Plenário do STF desproveu o recurso, vencidos as ministras Ellen Gracie (aposentada), relatora do caso, e Cármen Lúcia Antunes Rocha, bem como os ministros Joaquim Barbosa, Luiz Fux e Marco Aurélio.
A ação questionava a constitucionalidade do art. 19-A da Lei 8.036/1990, com a redação dada pela MP 2.164-41/2001, segundo a qual é devido o fundo de garantia ao trabalhador cujo contrato seja declarado nulo em razão do art. 37, par. 2º, da Constituição Federal, que estipula a necessidade de concurso público para o preenchimento de cargos no setor público.
O RE, com repercussão geral declarada pelo STF em setembro de 2009, começou a ser julgado no plenário em 17 de novembro de 2010. Votaram as ministras Ellen Gracie e Cármen Lúcia pelo provimento parcial do recurso, e os ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ayres Britto, desprovendo-o. Na ocasião, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa.
Voto-vista
Em seu voto-vista, o ministro Joaquim Barbosa ressaltou que no caso em questão a contratação foi manifestamente contrária à regra constitucional da prévia aprovação em concurso público, e era dever do estado, nesse caso, corrigir o desvio. Ao mesmo tempo, prosseguiu seu argumento, é impossível entrever a priori a boa fé ou má fé do trabalhador ao assumir um cargo público sem concurso público. O ministro Joaquim Barbosa sustentou ainda que a permissão para que os pagamentos sejam feitos indistintamente abriria caminho para a satisfação dos interesses "inconfessáveis" que muitas vezes motivariam a contratação irregular de servidores.
Após o voto do ministro Joaquim Barbosa, que se manifestou contra o direito dos trabalhadores não concursados ao FGTS, o ministro Luiz Fux pronunciou-se também nesse sentido. O ministro Marco Aurélio adotou a mesma posição, sustentando que o ato da contratação do servidor sem concurso é uma relação jurídica nula, que não pode gerar efeitos além do pagamento dos dias efetivamente trabalhados.
Divergência
O ministro Ricardo Lewandowski seguiu a divergência aberta pelo ministro Dias Toffoli no início do julgamento, favorável ao direito dos funcionários ao FGTS. Segundo o ministro, o artigo questionado é uma norma de transição, e caso alguém tenha agido com dolo ou culpa na contratação do servidor, ele responderá regressivamente nos próprios termos do art. 37 da Constituição Federal. A posição pelo desprovimento do recurso também foi a adotada no voto proferido pelo ministro Cezar Peluso.
O ministro Celso de Mello, ao adotar a posição pelo desprovimento do RE, destacou que o STF não transige na exigência do concurso público para o preenchimento de cargos públicos, chamou a atenção para a natureza transitória da norma, e para a impossibilidade de haver efeitos retroativos na decretação de nulidade do contrato de trabalho. O contrato nulo, diz, produz efeitos até a data em que é declarada a nulidade. "Daí a sensibilidade do legislador ao formular a regra de direito transitório, para precisamente reger essas situações ocorrentes em ordem a não prejudicar os hipossuficientes", concluiu Celso de Mello.
Recurso Extraord. nº: 596478
Fonte: STF
Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759