|   Jornal da Ordem Edição 4.305 - Editado em Porto Alegre em 24.05.2024 pela Comunicação Social da OAB/RS
|   Art. 133 - O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. Constituição Federal, 1988
NOTÍCIA

06.05.14  |  Advocacia   

“Advogado quase tem que fazer faculdade de informática para operar PJE”, afirma Lamachia

Em entrevista ao Bahia Notícias, o vice-presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, abordou a implantação açodada do processo eletrônico e a dificuldade dos advogados para atuar no sistema.

Confira a entrevista ao Bahia Notícias:

O vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, em sua passagem por Salvador, concedeu uma entrevista ao Bahia Notícias para falar sobre a migração do processo físico para o processo eletrônico.

Lamachia afirma que o Poder Judiciário já não dá mais conta da demanda, sendo que e a implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJe) é necessária por ser um "meio capaz de agilizar o andamento dos processos", e reforça que a Ordem não se coloca contra a implantação do sistema.

"A OAB entende que o processo judicial eletrônico é uma excelente ferramenta, mas ela deve ser implementada de forma lenta e gradual", diz Lamachia. Ele explica que a transição precisa ser gradual para que os advogados se adaptem ao sistema. Outro ponto destacado pelo vice-presidente da Ordem e que pode ser um problema é a falta de infraestrutura. Ele diz que a implantação do PJE requer internet banda larga de qualidade e energia elétrica.

A Ordem, segundo Lamachia, defende que a migração para o PJE seja feita da mesma forma que o imposto de renda migrou do papel para o meio digital. "Em um primeiro momento, nós tivemos o imposto de renda entregue em disquete; depois, nós tivemos imposto de renda que poderia ser feito pela internet. Houve essas duas modalidades para que houvesse uma adaptação da sociedade e dos contribuintes", explica. Diante das dificuldades encontradas por muitos advogados, o vice-presidente da Ordem diz que "o advogado quase tem que fazer uma faculdade de internet e tecnologia da informação para que ele possa se adaptar a todos os sistemas".

Bahia Notícias – Nós temos acompanhado a mudança dos sistemas eletrônicos judiciais aqui na Bahia, e a migração do processo físico para o digital. Eu gostaria que o senhor explicasse porque é necessário fazer essa transição. Qual a importância desta migração do processo físico para o processo digital, qual o ganho para a sociedade?

Claudio Lamachia – Hoje, todos nós sabemos que o Poder Judiciário já não dá mais conta da demanda de processos e que nós temos um orçamento que é finito. Portanto, nós temos que buscar, através da qualificação da gestão do Poder Judiciário e dos meios efetivos tecnológicos à disposição, novas fórmulas de minimizar os efeitos da morosidade do Judiciário. O Processo Judicial Eletrônico (PJe) é, efetivamente, um meio capaz de agilizar o andamento dos processos, e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não é contra a implantação desse sistema. A OAB entende que o processo judicial eletrônico é uma excelente ferramenta, mas ela deve ser implementada de forma lenta e gradual, para que, primeiro, se possa disponibilizar aos advogados os meios de treinamento, e, segundo, para que se possa ter a certeza de que nós teríamos acesso ao próprio sistema através dos seus meios tecnológicos necessários. Nossa preocupação é de que hoje precisamos, para a implementação obrigatória do processo judicial eletrônico, uma infraestrutura tanto de internet banda larga quanto de energia elétrica. Sem essa estrutura, um cidadão que estará representado por um advogado poderá ter seu direito comprometido em juízo. E é por isso que a Ordem tem defendido a coexistência das duas possibilidades. Por exemplo: imagine um cidadão, representado por um advogado, que esteja discutindo um direito seu em juízo e perde um prazo porque a internet não estava funcionando e, por isso, venha a perder seu imóvel. Como fica isso? Esta é a preocupação que a Ordem tem. O Conselho Federal da OAB e as Seccionais do Brasil hoje se preocupam muito com a migração dos sistemas. A migração para o sistema do PJE é necessária, mas ela tem que ser feita de forma gradual, responsável e de forma que não exclua, e sim, inclua os advogados e, por via de consequência, a sociedade.

BN – Como tem sido, na prática, a migração do sistema do processo físico para o digital? Em algumas unidades já não tem se aceitado mais o processo em papel...

Lamachia – Isso nos preocupa muito, por isso temos feito esta crítica. Nós entendemos que o processo judicial eletrônico deve, necessariamente, conviver harmonicamente com o sistema tradicional. Nós trazemos como exemplo exatamente o imposto de renda. Veja bem: ao longo de muitos anos, o imposto de renda foi trabalhado na ideia da migração para um sistema eletrônico. Em um primeiro momento, nós tivemos o imposto de renda entregue em disquete, depois nós tivemos imposto de renda que poderia ser feito pela internet. Houve essas duas modalidades para que houvesse uma adaptação da sociedade e dos contribuintes. Trabalhou-se sempre com a possibilidade de continuidade da entrega em papel. A exigência do processo judicial apenas pelo meio eletrônico está colocando em risco a sociedade e a cidadania.

BN – Essa diversidade de softwares que existe também é um problema? Temos o PJE, o E-SAJ, Projudi...

Lamachia – Seguramente! A Ordem busca a unificação de sistemas, porque, pela diversidade existente de sistemas no Brasil, o advogado quase tem que fazer uma faculdade de internet e tecnologia da informação para que ele possa se adaptar a todos esses sistemas. O processo judicial eletrônico é exatamente a unificação que se quer, mas deseja-se a unificação com um bom sistema. O processo judicial eletrônico ainda não é um bom sistema; ele precisa de inúmeras adaptações, e é isso que nós temos defendido.

BN – Como é que a OAB tem se posicionado sobre esta implantação do PJE neste momento? Há alguma interlocução com Conselho Nacional de Justiça [CNJ]? Como tem sido esta conversa com o CNJ?

Lamachia – Nós temos tido sim uma interlocução com o CNJ, buscando sensibilizá-los sobre a necessidade de atenderem aos pleitos da OAB, principalmente na questão importantíssima da coexistência dos dois sistemas por um período, para que se possa possibilitar aos advogados a necessária adaptação. Mas, até o presente momento, não conseguimos sensibilizar o CNJ da necessidade de observação desse tema.

BN – A Ordem vai tirar alguma deliberação das audiências que estão acontecendo país afora para discutir o PJE?

Lamachia – Certamente. A Ordem já encaminhou ao CNJ trabalhos técnicos buscando alteração de diversos pontos nos sistemas. Muitos dos temas foram efetivamente alcançados pelo CNJ, mas os assuntos principais ainda não conseguimos alcançar. Entendemos que o CNJ tem que ter uma maior sensibilidade neste tema, principalmente porque nós estamos falando de acesso à Justiça, e não se pode tirar isso do cidadão.

BN – Isso então seria uma lesão das prerrogativas do advogado?

Lamachia – Com certeza. O sistema, na forma que está hoje, pode sim trazer desrespeitos às prerrogativas da advocacia. Este desrespeito deve ser entendido como desrespeito ao próprio cidadão, porque as prerrogativas da profissão do advogado são postas em defesa do cidadão que ele representa. Se o advogado deixar de ter acesso ao processo judicial num determinado momento, ele estará tolhido de falar em nome do seu cliente.

BN – Uma advogada do Rio de Janeiro, que tem deficiência visual, pleiteou uma liminar no CNJ para continuar peticionando em papel. O que tem sido feito para garantir a acessibilidade do PJE para pessoas com deficiência, pessoas idosas etc?

Lamachia – Este é outro tema que preocupa a todos nós: a acessibilidade no âmbito do sistema. No que diz respeito aos advogados com deficiência visual, nós da OAB já conseguimos encaminhar uma solução. Mas volto a dizer: não adianta resolvermos o sistema apenas para aqueles colegas com deficiência; nós precisamos resolver o sistema para toda a advocacia e, consequentemente, para a cidadania.

BN – A advocacia é a que mais reclama do PJE. Aqui, na Bahia, na Justiça comum, foi implantado o E-SAJ, e muitos magistrados têm reclamado do sistema, que não disponibiliza os votos, o que não é seguro para aferir produtividade. Em que medida esses problemas afetam outras partes do Judiciário?

Lamachia – Isto é uma demonstração clara de que o sistema do processo judicial eletrônico está muito longe de ser uma unanimidade. Ao contrário, eu ousaria dizer que hoje ele é uma unanimidade no que diz respeito à crítica que sofre tanto de juízes quanto de advogados, quanto de membros do Ministério Público, quanto de servidores. Se todos os atores do processo criticam o atual momento do processo judicial eletrônico é porque ele precisa de adaptações, e estas devem ser feitas de forma gradual. Isso reforça a ideia da OAB de que o sistema deve ser implementado de forma absolutamente gradual, ou seja, possibilitando as adequações do sistema sem exclusão dos operadores do direito e, principalmente, sem prejuízo às partes.

BN – Uma das críticas é com relação às intimações. Existe um modelo de como elas devem ser realizadas segundo a OAB?

Lamachia – A OAB, neste primeiro momento, tem defendido muito que se continue utilizando a intimação via Diário, porque isto traz a segurança necessária. Nós temos que ter a visão de que o processo judicial eletrônico, neste momento de implantação, não pode ferir o direito e não pode, de forma alguma, ficar numa situação de falta de alcance numa determinada ação que seja fundamental.

BN – O próprio presidente da seccional baiana da OAB, Luiz Viana, disse o processo foi muito célere, e que deveria ter sido estendido com mais tempo, mais prolongado...

Lamachia – Não tenho a mínima dúvida. Isto é uma das críticas principais que o Conselho Federal da Ordem tem feito e eu tenho feito. Inclusive a vice-presidência da OAB é a encarregada de todo o acompanhamento do PJE, porque nós entendemos que é um dos temas mais importantes no momento na nossa democracia. Nós não podemos afastar o Judiciário das pessoas, nós temos que abri-lo cada vez mais. Entendemos que, no formato que está posto hoje, o processo judicial eletrônico está sendo implementado de forma absolutamente açodada, e isto poderá causar prejuízos à sociedade.

BN – O que o advogado deve fazer quando ele encontrar algum problema com o sistema? A quem ele deve recorrer?

Lamachia – O advogado, encontrando problemas ou tendo ideias, críticas e/ou sugestões, deve entrar em contato com as comissões de tecnologia de informação (TI) da OAB e com as comissões de prerrogativas dos advogados das respectivas seccionais da Ordem.

Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759

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