Decisões anteriores estipularam valor único para diversas formas de dano passível de ressarcimento no caso, com fundamentação e especificidade consideradas insuficientes.
A Rádio e Televisão Record S/A recebeu provimento a um recurso de revista, sendo determinado ao TRT2 (SP) o reexame do valor de indenização de R$ 3 milhões dada a jornalista vítima de acidente de trânsito. Segundo a 8ª Turma do TST, que julgou o caso, o novo montante deverá especificar o valor relativo a cada uma das indenizações pedidas (danos morais, materiais e pensionamento), e trazer a fundamentação para as importâncias definidas.
O acidente aconteceu em agosto de 2002, por volta das 23h, quando a profissional e sua equipe (cinegrafista e auxiliar) voltavam para a sede da empresa, em São Paulo, depois de uma reportagem em uma casa de espetáculos. A caminhonete Blazer em que estavam colidiu com um poste. Na reclamação, a autora afirmou que o motorista habitual da sua equipe de reportagem faltou ao trabalho naquela noite, e a empresa designou para substituí-lo um condutor que "sabidamente fazia dupla jornada" e estava "em visível estado de exaustão". Segundo a reclamante, ele chegou a dormir profundamente enquanto a equipe gravava, a ponto de ter de ser acordado com batidas fortes no vidro do carro.
A colisão feriu gravemente a jornalista e o auxiliar, que estavam sentados do lado direito do veículo. Depois de retirada das ferragens, ela permaneceu 40 dias internada (dez deles no centro de terapia intensiva), com diagnóstico de traumatismo crânio-encefálico com edema cerebral, e diversas fraturas expostas nos braços e pernas. Ao ter alta, precisou de três meses de atendimento domiciliar. As lesões resultaram em dificuldades motoras e cognitivas (de atenção, memória e linguagem, entre outros) e afetaram sua fertilidade, obrigando-a a se submeter a fertilização in vitro.
O juiz da 56ª Vara do Trabalho de São Paulo condenou a emissora a pagar indenização por danos morais, materiais e estéticos no valor de R$ 3 milhões e manter, de forma vitalícia, o plano de saúde nos mesmos moldes anteriores. A condenação foi mantida pelo TRT2, que apenas limitou a manutenção do plano "enquanto perdurarem os efeitos diretos ou indiretos do acidente".
Ao recorrer ao TST, a empresa pretendia a redução do valor da indenização, com o argumento de que a importância fixada era "irrazoável" e resultaria no enriquecimento sem causa da vítima. Sustentou ainda que caberia à trabalhadora comprovar as despesas que pretendia ver indenizadas a título de danos materiais.
Na análise do recurso contra a indenização global, a relatora do recurso, ministra Dora Maria da Costa, observou que o montante "expressivo" e incomum de R$ 3 milhões "já traz sérias dúvidas sobre a razoabilidade do arbitramento", exigindo atenção especial da Turma. A forma como o valor foi estipulado, segundo ela, também é questionável: nos casos em que o pedido trata de indenizações diversas, "o mínimo que se espera do julgador, em respeito ao art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, é a apuração individualizada de cada uma das espécies indenizatórias", com os respectivos fundamentos. "O julgador não pode simplesmente fixar aleatoriamente um montante global para cobrir todos os prejuízos sofridos, sem qualquer justificativa para tanto", ressaltou. Ela lembrou que, no caso, a sentença condenou a empresa em R$ 3 milhões em um único parágrafo de fundamentação.
Analisando separadamente as três espécies de dano, a magistrada concluiu que o valor ultrapassa os prejuízos decorrentes do fato, revelando-se exorbitante e não atendendo ao princípio da razoabilidade. Com este fundamento (art. 5º, inciso V da Constituição), a Turma conheceu do recurso para reduzir o montante.
A discussão seguinte se deu no sentido de devolver o processo ao Regional para que este reexamine o valor da indenização – em vez de a própria Turma fazê-lo. Dora Maria da Costa observou que, embora seja possível reconhecer a falta de razoabilidade da condenação, o acórdão não oferece elementos suficientes para que seja aferido "com precisão e justiça" um novo valor – e o TST não pode analisar as provas dos autos em busca dessas informações (Súmula nº 126). Assim, foi determinado o retorno do processo ao Regional, para que este estipule cada uma das espécies de indenização, apurando os respectivos valores separadamente e de forma fundamentada para a revisão da condenação.
Para o TST, na reparação do dano moral, o Tribunal deve levar em conta seu caráter compensatório e pedagógico e a congruência com a gravidade do evento lesivo, a extensão das lesões físicas, o grau de culpa e o porte econômico da empresa e as condições pessoais da vítima. A indenização por lucros cessantes em parcela única (correspondente ao pensionamento) deverá garantir à jornalista renda mensal com base na remuneração que recebia à época do acidente, proporcional à redução de sua capacidade de trabalho. Os danos materiais, finalmente, devem corresponder à soma dos valores comprovados das despesas já efetuadas com o tratamento.
Processo nº: RR-236200-28.2007.5.02.0056
Fonte: TST
Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759