Além de ter internalizado o produto no país de forma clandestina, o denunciado não se preocupou, ao menos, em atender algumas regras básicas exigidas na importação regular deste tipo de material.
O princípio da insignificância não pode ser aplicado nos casos de contrabando de medicamentos, já que a conduta traz prejuízos efetivos à saúde pública. Sob essa linha de entendimento, a maioria dos desembargadores integrantes da 8ª Turma do TRF4 aceitou denúncia criminal contra um homem pego na posse de 14 comprimidos contendo sildenafila – indicado para disfunção erétil – na fronteira com o Uruguai.
O desembargador Paulo Afonso Brum Vaz, cujo voto divergente saiu vencedor, disse que a conduta do acusado, em tese, está tipificada no art. 334 do CP: ‘‘importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria’’. Amparado na jurisprudência assentada no Colegiado, afirmou que denúncia poderia ser aceita. De acordo com o magistrado, além de ter internalizado o produto no país de forma clandestina, o denunciado não se preocupou, ao menos, em atender algumas regras básicas exigidas na importação regular deste tipo de produto, como apresentar o receituário médico à autoridade sanitária e demonstrar a compatibilidade do medicamento internalizado com a respectiva posologia. ‘‘Não subsiste, portanto, neste juízo preliminar, a tese da atipicidade da importação irregular dos medicamentos apreendidos’’, definiu.
O juízo do 1º grau federal rejeitou a denúncia oferecida pelo MPF, por entender que a conduta era atípica – em virtude da pequena quantidade apreendida de comprimidos. Logo, declinou da competência do caso para a Justiça Estadual da Comarca de Santana do Livramento (RS), que faz fronteira com o país vizinho. O Ministério, então, interpôs Recurso Criminal em Sentido Estrito, objetivando o recebimento da denúncia e o consequente processamento do feito até o final do julgamento. Em síntese, sustentou que não há como considerar a conduta inofensiva ou atípica, pois é evidente que um medicamento em tais circunstâncias tem grande potencialidade lesiva.
O relator do recurso, desembargador Luiz Fernando Wowk Penteado, disse que faltava justa causa para a persecução penal, pela pequena quantidade de medicamentos apreendida. Tal volume afastaria qualquer destinação comercial e demonstraria a ausência de lesividade ao bem jurídico tutelado – a saúde pública. Logo, a conduta seria ‘‘materialmente atípica’’.
Em socorro de sua tese, citou precedente da própria turma, da relatoria do juiz federal convocado Sebastião Ogê Muniz. O excerto da ementa diz: ‘‘O agente que importa clandestinamente medicamentos em pequenas quantidades - não representando a conduta, portanto, especial potencial lesivo à saúde pública - incide na pena do crime definido no art. 334 do CP, em detrimento do delito do art. 273, §1º-B, do CP, destinado à internalização irregular de fármacos em larga escala. Se, ainda que, na sentença, ocorre a desclassificação do crime delineado na denúncia para delito cuja pena máxima prevista em abstrato é igual ou inferior a um ano, afigura-se possível o oferecimento de proposta de suspensão condicional do processo’’.
O desembargador-relator também citou o Anexo XII, Capítulo II, item 4, do Regulamento Técnico de Vigilância Sanitária de Mercadorias Importadas nº 350, da Associação Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que dispõe: ‘‘quando for constatada que a finalidade [do medicamento] é para seu uso pessoal, a medicação pode ser internalizada devidamente acompanhada de seu respectivo receituário médico, comprovando assim sua finalidade’’.
Processo nº: RCSE 0002124-14.2009.404.7106/RS
Fonte: Conjur
Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759