Decisão considerou que forçar o portador de necessidades especiais a rever os rumos de sua própria vida, além de configurar proteção adicional desnecessária, é também uma segunda violência, que se soma à sua limitação locomotora.
Um pedido de impugnação foi negado ao Ministério Público, que desejava recorrer da homologação de acordo decorrente de acidente de trabalho que tenha sido livremente celebrado por pessoa portadora de deficiência física. Com esse entendimento, a 3ª Turma do STJ negou pedido do MP-SP contra decisão do Tribunal de Justiça daquele estado.
O trabalhador ajuizou pedido de homologação de acordo extrajudicial realizado com a sua ex-empregadora, a Central de Álcool Lucélia Ltda., em decorrência de acidente de trabalho. Ele afirmou que trabalhava na empresa como tratorista e, em novembro de 1997, sofreu um acidente que deixou sequelas irreversíveis, levando-o à aposentadoria por invalidez.
Em função do acidente, as partes celebraram, em abril de 2001, acordo extrajudicial para composição dos danos decorrentes do acidente, o qual foi homologado em maio do mesmo ano. Três anos depois, pediram o desarquivamento dos autos e formularam nova proposta. Em audiência, o acidentado declarou-se ciente dos novos termos e o acordo foi homologado. Entretanto, o MP impugnou a homologação, mas o TJSP a manteve. "Ausência de previsão legal para atuação do Ministério Público, porquanto embora deficiente, não há qualquer interesse difuso ou coletivo a ser acompanhado e a ação não é civil pública, mas mero acordo judicial submetido à homologação judicial", afirmou a decisão.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o acordo celebrado pelo deficiente, ainda que abrindo mão de tratamento de saúde em troca de dinheiro, não pode ser impugnado pelo MP, com fundamento do art. 5º da Lei 7.853/89. "A deficiência física não tira da pessoa sua capacidade civil e sua aptidão para manifestar livremente sua vontade", destacou.
Segundo a ministra do STJ, já basta ao deficiente a violência decorrente de sua limitação física. "Não é admissível praticar uma segunda violência, tratando-o como se fosse relativamente incapaz, a necessitar de proteção adicional na prática de atos ordinários da vida civil, proteção essa que chegue ao extremo de contrariar uma decisão que ele próprio tomou acerca dos rumos de sua vida", concluiu a julgadora.
Processo nº: REsp 1105663
Fonte: STJ
Rodney Silva
Jornalista - MTB 14.759