Por Claudio Lessa,
jornalista
Não faz muito tempo, o Brasil vivia debaixo de uma ditadura militar que prendia e arrebentava. Hoje, com a abertura proporcionada pelo regime democrático, muitos acham que a vida está ganha, sem parar para prestar atenção no fato de que muitos dos que lutaram pela “democracia” durante a dureza da direita a queriam, apenas, para poder jogar o pêndulo para o outro lado, ou seja, a ditadura das esquerdas – que no Brasil desde sempre, como já disse por aqui mais de uma vez, tendem a ser de uma burrice descomunal.
Não faz muito tempo, o Brasil vivia debaixo de uma crise econômica que tinha a inflação como sub-produto mais perverso e vilões tão incríveis quanto a incapacidade instalada para combater o mal que assolava a economia: uma hora, o culpado pela inflação – que chegou a 40 por cento enquanto vivi por estes lados – era o chuchu. Outra hora, era a cebola.
Hoje em dia, com a economia funcionando como um relógio de razoável procedência (ainda não é suiço), a turma que nunca precisou sacar o salário todo no final do mês, assim que ele era depositado, para fazer compra de comida, pagar as prestações e rezar para que sobrasse algum nos próximos trinta dias acha que nada de mal jamais ocorrerá.
Está tudo errado. É preciso saber pelo que passamos e observar o que estamos atravessando para termos idéia de onde poderemos chegar. A afiada operação Navalha está aí para mostrar como ainda é tênue a linha que separa a democracia do autoritarismo, no Brasil. Por um lado, Polícia Federal e o Ministério Público articulam operações espetaculares contra a cancerosa corrupção. De outro lado, o mastodôntico Judiciário, encarregado de digerir a montanha de provas, evidências, confirmações e atestados (de mau caratismo e de burrice, também) providenciada pela polícia desmonta metodicamente as operações, livrando a cara de todo mundo e reforçando a imagem de que o Brasil é, efetivamente, o país da impunidade.
Como se não bastasse, ainda há as brigas públicas entre prima-donas do Direito, que tentam se esganar numa versão de alto nível – mas igualmente patética – do Programa do Ratinho.
Quem tem razão? Nenhum dos dois lados, rigorosamente. Um lado quer prender de uma vez e acusar – e acaba sendo acusado de instaurar um estado policialesco que só beneficia aqueles que tem como ideologia o fechamento do regime, para um lado ou para outro. O outro lado, o que tira todo mundo da cadeia e acaba não julgando ninguém, revela a face obsoleta, anacrônica e corrupta do sistema judiciário brasileiro, sob a – aqui – surrada capa do “direito à presunção de inocência até prova em contrário.”
E a opinião pública? Bate palmas, como num circo. Mas logo se esquece de um caso, e já fica, ansiosa, “no aguardo” do próximo.
O Brasil passa por três problemas, hoje em dia: a democracia é ainda muito, mas muito frágil, mesmo; o brasileiro tem mania de se esquecer depressa das coisas, e por essas bandas só existem direitos – não há deveres.
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(*) Artigo originalmente publicado em www.diretodaredacao.com - saite editado em Miami
(EUA). O autor trabalhou na Rede Globo, Radiobrás, Voz da América, Rede Manchete, Rádio JB e CBS Brasil. Foi correspondente na Casa Branca durante vários anos. Vive e trabalha atualmente em Brasília.
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