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Publicado em 07.05.07

As sentenças placebo - Artigo de Joaquim Saturnino da Silva


Por Joaquim Saturnino da Silva,
advogado (OAB/SP nº 184.718)
 
É bastante conhecido – e já comprovado – na Medicina, o efeito placebo. Trata-se do ato de se ministrar um pseudomedicamento que, a despeito de não conter nenhum princípio ativo que se possa classificar como remédio, sendo, no entanto, informado ao paciente o contrário. Assim, sem o saber, o paciente melhora ou se cura, por ter acreditado que ingeriu um medicamento legítimo.
 
Tal procedimento, ao que tudo indica, migrou para a área jurídica, dando-nos para “engolir”, as sentenças placebo. Ou seja, não são sentenças exaradas por juiz, mas por alguém muito próximo que “ajuda”, com essa prática, a desafogar o assoberbado exercício da jurisdição. De tal sorte que, na mesma esteira, nasceram  o despacho placebo e a decisão interlocutória placebo - e por aí vai.

Tais sentenças e demais decisões não são tecnicamente legítimas, mas contra elas temos que nos debater em outra instância. Haja prejuízo!
 
Não é de todo difícil identificar uma sentença placebo, pois ao examiná-la descobrimos que, se foi o juiz que a exarou, urge que ele retorne para o curso de graduação, ou tome um medicamento (não um placebo) para o combate da preguiça de ler e pensar.
 
Pois o  grande nó, é que a necessária rigidez processual não permite ao juiz modificar o julgado que, inadvertidamente, assinou. Maldita pressa!
 
E assim, quando uma dessas sentenças atinge a parte inocente, sendo causa de inquestionável injustiça, novos remédios jurídicos terão que ser manejados, demandando tempo e despesas desnecessários.
 
Ainda, um processo que poderia estar resolvido, permanece entulhando as pautas. É quando, então, ironicamente uma certa “agilização informal”, colabora com a morosidade na Justiça. E isto nada mais é que um imenso desserviço à credibilidade no Judiciário.
 
Ultimamente, juízes estão na berlinda, por conta de algumas laranjas podres espalhadas pelo Judiciário, não por sentenças placebo exatamente, mas por coisas piores. Por coincidência, ou não, surgiu também a discussão sobre sentenças que não são sentenças, elaboradas por auxiliares, mas que acabam por se tornar um quase término de processo; no entanto, terminam por se estender na linha do tempo, havendo casos em que somente netos de autores chegam a conhecer o final da demanda.
 
Somando-se as coisas, é incontrolável a invasão de nosso ser, por uma infinita tristeza em “união estável” com uma não menos infinita decepção. Esfacela-se, com uma celeridade cada vez maior, aquela nossa secreta esperança de que vale a pena o bom combate e fé na Justiça, porque, se o resto não é sério, o Judiciário é. Porém, é imperativo ponderar que, mesmo sério o Judiciário, ele peca pelo descaso com as condições de trabalho de seus membros. Existem varas onde os computadores utilizados pelos escriturários são de propriedade deles mesmos e não fornecidos pelo Estado. Mas isso é outra história.
 
Então, por tantas e tristes razões, cambaleia nossa esperança de que aquele documento juntado ao processo será apreciado. Que aquele depoimento da testemunha será criteriosamente avaliado e que, sopesados os fatos à luz do direito, a Justiça será feita.
 
E mesmo assim, depois de tudo feito, haveremos de passar pelo suspense do momento da  sentença, pois todo mundo sabe o que diz a jocosa metáfora popular a respeito de bebês e cabeça de magistrado.
 
Após essas agruras, como seguir acreditando que não merecemos um nariz de palhaço a enfeitar nosso rosto?  Como apagar aquela pequena luz  vermelha a piscar em nossa mente: otário! Otário! Otário!?
 
A única e lógica resposta possível é: perseverando. 
 
Não importa se a letra está morta, temos que seguir brigando para fazê-la ressuscitar, a despeito de tudo.  Enfrentar as vicissitudes desnecessárias da profissão, como estas, para, quem sabe, encontrar guarida até chegar à última instância. E caso o socorro não surja, apenas nos restará entregar o caso à Instância Celestial.
 
O complicado é explicar isso tudo à parte que está a nosso cargo defender!
 
(*) E.mail: [email protected]