Direito à indenização por danos sofridos durante regime militar é imprescritível


26.04.07 | Diversos

O Espaço Vital divulgou, ontem (25), com primazia que o direito à indenização decorrente de torturas praticadas durante o regime militar é imprescritível.

Hoje (26) o saite do STJ traz maiores detalhes sobre o julgamento ocorrido há duas semanas. O entendimento da 1ª  Turma é que "a proteção da dignidade da pessoa humana - direito inato, universal, absoluto, inalienável e imprescritível, segundo a doutrina - , como confirmado pelas cláusulas pétreas constitucionais, perdura enquanto existir a própria República Federativa".

Para a Turma, trata-se de fundamento da Constituição, de um de seus pilares e, como tal, não se pode falar em prescrição, ainda mais se a Constituição Federal não estipulou período prescricional ao direito de agir correspondente àquele direito à dignidade.

A discussão começou quando Hélio da Silva ajuizou ação contra União. Visava ao pagamento de indenização de R$ 630 mil por danos materiais e de R$ 151 mil a título de danos morais, valores acrescidos de juros e correção monetária. Pediu, ainda, o pagamento de pensão mensal vitalícia (parcelas vencidas e a vencer) de R$ 1.500,00, com efeitos financeiros a contar da entrada em vigor da Lei n.º 9.140/95.

Segundo narrativas contidas no processo, Silva, por ocasião de sua atuação política “em defesa das instituições militares e contra o ‘golpe militar’, de 31 de março de 1964, foi preso por agentes militares do 1º Exército, em 29 de março de 1972. Durante a prisão, ele afirma ter sido torturado, sendo, posteriormente, condenado pela Segunda Auditoria da Marinha à pena privativa de liberdade de 15 anos, sete meses e seis dias, sendo libertado somente em 05 de dezembro 1980, por força da Lei de Anistia.

Segundo Silva, como conseqüência das torturas a que foi submetido, passou a ser portador de síndrome do pânico e "paranóia de perseguição", que o obrigam a se submeter a tratamentos médicos até os dias atuais. À época dos fatos, Hélio Silva exercia a profissão de motorista, mas foi demitido em 14 de março de 1972, por perseguição política.

A Justiça Federal da 2ª Região nem chegou a apreciar o pedido, entendendo que, no caso, o direito já estaria prescrito. Segundo o entendimento dos magistrados, a prescrição é de cinco anos. Como o direito pleiteado pelo autor surgiu com a Constituição Federal de 1988, que concedeu anistia a todos aqueles que participaram de atividades políticas no período de 18 de setembro de 1946 até a data da sua promulgação, a prescrição qüinqüenal, prevista no artigo 1.º do Decreto n.º 20.910/32, teria se efetivado em 05/10/1993.

Diante desse entendimento, Hélio da Silva recorreu ao STJ. O relator do recurso especial, ministro Luiz Fux, destaca em seu voto que a tortura e morte são os mais expressivos atentados à dignidade da pessoa humana, “valor erigido como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil”.

Além de direito consagrado na Constituição, explica o ministro, a Lei n.º 9.140/95, que criou as ações correspondentes às violações da dignidade humana praticadas em período de supressão das liberdades públicas, previu a ação condenatória no artigo 14, sem estipular-lhe prazo prescricional, por isso a lei especial convive com a lei geral, “sendo incabível qualquer aplicação analógica do Código Civil ou do Decreto n.º 20.910/95 no afã de superar a reparação de atentados aos direitos fundamentais da pessoa humana, como sói ser a dignidade retratada no respeito à integridade física do ser humano”.

Para o ministro Luiz Fux, associam-se à lei interna as inúmeras convenções internacionais firmadas pelo Brasil como a Declaração Universal da ONU e demais convenções específicas sobre a tortura, tais como a Convenção contra a Tortura adotada pela Assembléia Geral da ONU, a Convenção Interamericana contra a Tortura, concluída em Cartagena, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).

O entendimento do ministro foi seguido à unanimidade pela Primeira Turma. Com isso, foi afastada a aplicação da norma do artigo 1.º do Decreto n.º 20.910/32, e, dessa forma, fica determinado o retorno dos autos à instância de origem para que dê prosseguimento à ação. (Resp nº 816209).