“O judiciário brasileiro não pode sofrer nenhuma interferência política partidária, e, se isso ocorrer, a história irá se repetir”, enfatizou Breier em palestra sobre o “onde estava a Justiça no terceiro reich? ”


17.08.18 | Advocacia

Uma tarde e início de noite, desta quarta-feira (15), de muita reflexão, de sentimentos diversos, de histórias, conhecimento, sobretudo de direitos da humanidade, foi o que a Comissão de Diretos Humanos da OAB/RS (CDH) proporcionou a toda a classe jurídica e à cidadania, por meio do evento Direitos Humanos: necessário combate ao preconceito ‘onde estava a Justiça no terceiro reich? ’. O evento faz parte da programaçãodo Mês da Advocacia da OAB/RS, e teve a parceria da Federação Israelita do Rio Grande do Sul (FIRS). O encontro, que teve três painéis, aconteceu no auditório da OAB/RS.

O presidente da OAB/RS, Ricardo Breier, palestrou no painel Diálogos sobre a Justiça e explanousobre o período político da Alemanha de 1933 a 1945, época do terceiro Reich. O dirigente seccional proporcionou uma reflexão entre os presentes e fez um contexto histórico dos dias anteriores a atuais: “Pouco se sabe ainda sobre o terceiro Reich, bem como o que aconteceu no Brasil na época da ditadura, entretanto é um período que reestrutura a definição da história dos direitos humanos e foi um retrocesso dos movimentos de Direitos Humanos e acima de tudo foi um movimento legitimado pelos três poderes da Alemanha. Eles se aliaram a essa política nacionalista”. “Isso é muito recente na nossa história e trouxe reflexos para a Segunda Guerra, para a Guerra Fria e reflete nos dias de hoje

Breier também falou também sobre a evolução do Direito Penal e destacou a omissão da justiça naquele período: “A omissão do judiciário não é muito falada ou é exibida em filmes, por exemplo. É obscuro ainda. Muitos juízes não se opuseram às legislações da época e chancelavam todas elas, ou seja, eles legitimavam e assinavam sentenças de morte. E pouquíssimos juízes foram condenados na Alemanha devido a esse fator cruel”. O presidente concluiu, falando sobre a situação atual do Brasil e faz um comparativo: “Onde está a justiça no Brasil? O judiciário brasileiro não pode sofrer nenhuma interferência política partidária, e, se isso ocorrer, a história irá se repetir. Estamos longe de saber a resposta para onde estava a justiça naquele momento, portanto esse é o nosso desafio: o de buscar essas repostas para que possamos evitar que um ciclo se repita”, concluiu.

O secretário-geral da OAB/RS, Rafael Canterji, enfatizou a importância de discutir o tema: “Com esse evento, cumprimos também o papel e o dever institucional da defesa intransigente dos Direitos Humanos. Esse momento é o de recordar, para que possamos ter a dimensão do que se viveu naquela época. Não podemos aceitar o que foi vivido no passado com indiferença, tampouco aceitar o presente que não é satisfatório. Lembrar é transformar em ações para que possamos mudar a realidade que nós vivenciados no mundo”.

O coordenador do evento, membro honorário da OAB/RS e coordenador da Comissão de Deveres e Direitos Humanos da Federação Israelita do RS, Luiz Carlos Levenzon, salientou que o evento tem como objetivo “não tratar apenas do holocausto, mas também expandir a discussão para outras situações concretas da nossa atual realidade. Esse painel tem a participação de várias comissões da OAB/RS ligadas ao movimento de Direitos Humanos, pois é um assunto que envolve todos, e é muito importante porque nós, como brasileiros e advogados, temos que lutar incansavelmente pela desideologização”, disse.

Painel III

Ainda no painel Diálogos sobre a Justiça, o presidente da Comissão Especial da Verdade da Escravidão Negra no RS da OAB/RS, Jorge Terra, ressaltou a questão do preconceito: “Apesar de todas as políticas públicas, nota-se uma defasagem de pessoas negras no mercado de trabalho, na educação, enfim, e não é por falta de legislação.  Há um artigo no código penal que tem a definição do crime, porém não tem pena: é o de racismo. Segundo um estudo, cerca de 70% das pessoas que respondem pelo crime racial é absolvido. O número de pessoas que não respondem por esse crime é maior ainda. Pessoas estavam sendo mortas, saindo das suas casas, estigmatizadas e outras, e eu faço uma relação com o que é a morte de jovens negros no Brasil, ou seja, a cada 100, morrem 71.

Em seguida, a vice-presidente da Comissão Especial de Diversidade Sexual da OAB/RS, Gabriela Lorenzet, falou sobre alguns pontos dos direitos da população LGBT, sobretudo dos homossexuais que viveram no período do holocausto: “Aproximadamente 100 mil homens gays foram presos nesse período, e não há número de mortos. Viviam e sofriam situações degradantes”. Ela ainda fez um comparativo com a vida e o mercado de trabalho da população de travestis e transexuais nos dias atuais: “O Brasil é o país que mais mata os LGBTs. As mulheres travestis e transexuais sofrem muitas agressões. Os nazistas acreditavam na cura gay, e hoje, nós lutamos para desmitificar isso, porém as igrejas disseminam que é uma doença”, ressaltou.

Painel II

O segundo painel da noite “Direito à Memória” ficou a cargo do diretor do Museu do Holocausto de Curitiba/PR, Carlos Reiss.  A coordenadora da mesa foi a vice-presidente da Comissão da Mulher Advogada, Aline Eggers.

Painel I

O painel “Compromisso Moral e Lições de Solidariedade” teve a presença da professora e historiadora, Ieda Gutfreind, a qual disse que o tema é difundido desde 2008 pelas Lojas da B´nai B´rith do Rio Grande do Sul e pelo Instituto Cultural Judaico Marc Chagall, com o intuito de incentivar e promover discussões sobre direitos humanos, respeito à diversidade étnica, cultural, religiosa e social. A coordenadora da Comissão de Diretos Humanos da OAB/RS, Neusa Bastos foi a coordenadora da mesa. Participaram do painel três sobreviventes do Holocausto: Bernard Kàts, judeu, holandês, foi escondido por famílias holandesas; CurtisStanton, judeu, alemão, foi ofendido, diversas vezes, na sua escola por ser judeu e esteve no campo de concentração de Aushwitz e Johannes Melis, católico, holandês, cujos pais abrigaram, durante a guerra, duas famílias judias, além de pilotos ingleses, canadenses e americanos.

A presidente do TRT4, Vania Cunhas Mattos, participou do painel e agradeceu a oportunidade: “Esse assunto tem importância vital nos dias atuais e traz uma grande reflexão, pois aqui se tem muitas histórias”, frisou.

O presidente da Federação Israelita do RS, Roberto Wofchuk , salientou que “temos a preocupação de defender todas as minorias que tiveram seus direitos suprimidos, ou seja, não somente os judeus,  mas negros, mulheres, negros, gays,  enfim, e ficamos felizes em estar presente a esse evento”, acrescentou. 

O Coronel Dirnei Vieira de Vieira, representando do TJRS, disse que “temos que respeitar e trabalhar contra as discriminações. O Poder Judiciário tem o papel preponderante nisso, para fazer com que o respeito, as leis e as pessoas sejam tratadas de forma justa e correta”, enfatizou.

Vanessa Schneider
Jornalista MTE 17.654

Fonte: OAB/RS