Nos últimos três anos, cerca de 2500 ocorrências de abuso sexual infantil foram registradas no Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (DECA). Em Porto Alegre, a média é de um caso por um dia. Ainda segundo dados da DECA, esses índices vêm aumentando cada vez mais. No País, a estatística é que, a cada 24 horas, cerca de 320 crianças são abusadas sexualmente todos os dias. Segundo a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do total de estupros no território brasileiro, 70% são contra essa parcela da população.
Para a OAB/RS, é hora de refletir sobre esse tipo de violência e encontrar meios para pôr fim a ela. Com a ideia de prevenir e combater o abuso infantil, a Ordem gaúcha, por meio da sua Comissão da Criança e do Adolescente (CECA), lançou a campanha “Nem todos os monstros vivem embaixo da cama”. A ideia é conscientizar a população sobre a importância de denunciar, caso presencie ou seja vítima de exploração sexual, no Disque 100.
Para o presidente da Ordem gaúcha, Ricardo Breier, a campanha contribui para a conscientização da sociedade. “Sabemos que falar sobre abusos sexuais é um tabu, e a sociedade tem dificuldade de falar sobre isso. Mas este debate é muito importante. Temos que informar e conscientizar as pessoas. A maior ferramenta que se tem hoje para combater o abuso é a informação”, reitera.
“Nem todos os monstros vivem embaixo da cama”
A campanha foi lançada no dia 15 de maio, durante a Audiência Pública: Prevenção e Combate à Pedofilia. O evento também foi para marcar o dia 18 de maio, quando é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. A data remete a 18 de maio de 1973, quando outro crime semelhante ao de Naiara ocorreu: Araceli Crespo, de 8 anos, foi raptada, estuprada e morta por jovens de classe média alta em Vitória (ES). Os agressores nunca foram punidos.
O presidente da CECA, Carlos Kremer, explica que durante o evento, no momento do lançamento da campanha, foram debatidos encaminhamentos para incentivar ações efetivas, especialmente no que se refere a políticas públicas continuadas e prioritárias na área do direito da criança e do adolescente. “Concluímos que precisamos especializar mais a Rede de Proteção, aparelhar e estruturar mais esta Rede, bem como os Órgãos de Proteção”, disse. “A pedofilia é uma perversão e deve ser combatida através da prevenção. Importante, também, realizar o acompanhamento dos pós fato, combater a indústria da pornografia que estimula o estupro de vulnerável, além combater a desigualdade das relações entre algoz e vítima”, ainda reitera. “Na mesma linha, controlar o conteúdo de programas televisivos que estimulem a cultura do estupro e reduzem a mulher e a criança a mero objeto de desejo, enfraquecendo os laços sociais”, disse.
Resoluções da Audiência Pública:
1) Recomendação aos órgãos de proteção para que se especializem mais para tornar os encaminhamentos mais eficazes;
2) Acompanhamento dos pós fato;
3) Maior estrutura na rede de atendimento;
4) O aumento de casos revela o maior estímulo para as denúncias;
5) Combater a indústria da pornografia que estimula o estupro, bem como as relações desiguais;
6) Mais controle de programas televisivos que estimulam a cultura do estupro e reduzem a mulher a objeto e enfraquecem os laços sociais;
7) Pedofilia é uma perversão e deve ser combatida através da prevenção e gera interesses comerciais que merecem desestímulo;
8) Maior especialização na área da psicologia para obtenção de laudos confiáveis;
9) Desestimular músicas de conteúdo sexual, dar às famílias carentes melhores condições de habitabilidade de modo a evitar a promiscuidade nas famílias de baixa renda. Maior interferência do estado nas comunidades indígenas que adotam a cultura do estupro;
10) Castração química dos pedófilos a fim de evitar a reincidência de casos;
11) Mais especialização na área para capacitar profissionais da rede de proteção.
O abuso infantil
No dia 9 de março, uma menina de 7 anos caminhava sozinha em direção à sua escola, quando, no meio do caminho, o motorista de um carro a convence a entrar no veículo. Dias depois, não mais vista desde então, intensas buscas foram realizadas, até que a triste notícia veio: a menina Naiara Soares Gomes havia sido encontrada morta, com sinais de estupro, na região da represa do faxinal nos arredores de Caxias do Sul. O crime comoveu o Rio Grande do Sul. A história de Naiara aumenta o índice de violência infantil em um país onde, a cada 24 horas, 320 crianças e adolescentes são vítimas de abuso, segundo a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Do total de estupros no território brasileiro, 70% são contra essa parcela da população.
Os números assustam: chega de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes!
Os sites de notícias e jornais trazem todos dias manchetes como estas: “Professor que ofereceu trocar nota por sexo é acusado por assédio”; “Mãe é suspeita de estuprar a filha e pai é preso por omissão”; “Operação da Polícia Civil prende suspeitos de pedofilia em SP”; “Menina abusada por padrasto define ‘amor’ de forma triste” e “Brasil registra maior número de casamentos infantis no continente”.
A violência está em todo recanto brasileiro: segundo dados da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, cerca de 500 mil crianças e adolescentes foram explorados sexualmente no Brasil (a maioria delas entre 7 e 14 anos) entre 2012 e 2015. Ainda se estima que, a cada 24 horas, 320 crianças sejam exploradas em todo o país. Apenas 7 em cada 100 casos são denunciados. Nas rodovias federais, há dois mil pontos de exploração sexual de meninos e meninas.
Em 2017, o governo brasileiro trouxe dados atualizados sobre o perfil das vítimas: cerca de 67,7% das crianças e jovens que sofrem abuso e exploração sexuais são meninas. Os meninos representam 16,52% das vítimas. Os casos em que o sexo da criança não foi informado totalizaram 15,79%. Os dados sobre faixa etária mostram que 40% dos casos eram referentes a crianças de 0 a 11 anos. As faixas etárias de 12 a 14 anos e de 15 a 17 anos correspondem, respectivamente, a 30,3% e 20,09% das denúncias. Já o perfil do agressor aponta homens (62,5%) e adultos de 18 a 40 anos (42%) como principais autores dos casos denunciados.
Denuncie!
Conforme o Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF, as denúncias de abuso ou exploração sexual de crianças e adolescentes podem ser feitas no conselho tutelar mais próximo ou para o Disque Denúncia Nacional – Disque 100, um serviço de utilidade pública que recebe e encaminha denúncias de violências contra meninos e meninas.
Desde que o governo federal implantou o serviço em 2003, os números de atendimentos e denúncias recebidas aumentam a cada ano. Em 2003, o serviço recebeu 4.494 denúncias; em 2008, esse número chegou a 32.588, com uma média diária de 89. Em seis anos, são mais de 95 mil denúncias e 2,2 milhões de ligações atendidas – entre elas, dúvidas e sugestões.
Além de violência sexual, o Disque 100 recebe denúncias de maus-tratos, negligência, pornografia, entre outros crimes. A maior parte das denúncias recebidas pela central são contra meninas, 62%. Esse número sobe para 81% quando as denúncias são de violência sexual.
A ligação é gratuita, e o usuário não precisa se identificar. O Disque 100 funciona todos os dias, das 8h às 22h. O serviço é executado pela SEDH, em parceria com o Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (Cecria) e a Petrobras.
A Polícia Civil do RS possui o Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (DECA): Av. Augusto de Carvalho, n° 2000, e o telefone de contato é o (51) 2131-5700. Também é possível fazer denúncias online aqui
Punição
No dia 8 de maio de 2017, o Governo brasileiro sancionou duas novas legislações relacionadas ao tema: a Lei nº 13.440 /2017, que estipula pena obrigatória de perda de bens e valores em razão da prática dos crimes tipificados, como prostituição ou exploração sexual; e a Lei nº 13.441/2017, que prevê a infiltração de agentes de polícia na internet com o fim de investigar crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes. Também foi sancionada, em abril do ano passado, a Lei nº 13.431/2017, que estabelece a escuta especializada e o depoimento especial para crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência.
Sociedade Brasileira de Psicologia afirma: abuso gera traumas devastadores
Segundo informações da Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP), a violência sexual é a violação dos direitos sexuais, no sentido de abusar ou explorar o corpo e a sexualidade de menores. A maioria das pessoas associam violência sexual ao ato de penetração forçado, quando, na verdade, a violência sexual infantil é muito mais ampla, gerando traumas devastadores em qualquer manifestação que ela ocorra.
Ainda no nosso país, 95% dos casos desse tipo de violência são praticados por pessoas conhecidas das crianças. Em 65% dos casos, há a participação de pessoas do próprio grupo familiar. O agressor nem sempre é um homem, mulheres também praticam violência sexual infantil. Dados da Polícia Federal revelam que a cada dez pedófilos, um é mulher. No último estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) sobre Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde, de 2011, em geral, 70% dos estupros são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, o que indica que o principal inimigo está dentro de casa, e que a violência nasce dentro dos lares. A pesquisa também apresenta os meses, dias da semana e horários em que os ataques costumam ocorrer, de acordo com o perfil da vítima. Veja aqui
Sinais de abuso
A SBP explica que a criança não entende que está sofrendo um tipo de violência, ficando sem saber como agir ou reagir. É fundamental que pais e professores fiquem atentos à linguagem não-verbal de pedidos de ajuda ou sinalizações de trauma, normalmente expressos em comportamentos, produções gráficas ou produções lúdicas. Podem ser sinais de abuso: perturbações no sono; o apetite pode aumentar ou diminuir; o desempenho na escola pode ter queda; além de haver mudanças de comportamento bruscas e repentinas. Leia mais aqui
Como se proteger?
A SBP ainda orienta que, antes de mais nada, a prevenção começa ao se estabelecer uma base de confiança e segurança sólida da criança com os pais. Agressores sexuais tendem a buscar um perfil de crianças que sofram de baixa autoestima e insegurança, por serem mais manipuláveis. Quando a criança possui uma boa relação com os pais, diminui a chance de ser vista como um alvo fácil no olhar de um agressor. Veja as orientações:
- Compartilhe valores e informações sobre o próprio corpo. Com linguagem acessível, alerte a criança de que ninguém, sequer pessoas de seu grupo familiar, possuem liberdade para acariciar suas partes íntimas. Incentive sempre a comunicação caso ocorra algo neste sentido. Previamente, desfaça temores que o agressor possa construir, assegure sempre que você não a deixará, não sentirá raiva e que sempre estará aberta para dúvidas ou esclarecimentos.
- Seja seletivo com as pessoas que participam da vida de seus filhos, principalmente quando se diz respeito à intimidade. Avalie e escolha quem pode ter liberdade para entrar no quarto ou acompanhar a troca de roupas, um banho, etc.
- Acredite em seu filho sempre que trouxer alguma questão, ao invés de descartar imediatamente o relato, achando que se trata de fantasias e imaginação. Converse, investigue e questione. Ao confiar, você está respeitando e zelando por seus direitos de desenvolvimento e proteção.
Fonte: OAB/RS