Os julgadores entenderam que a situação apresentada nos autos forma um conglomerado de posturas omissivas que, entrelaçadas, sugerem uma prestação deficiente do serviço público.
O município de Campo Grande foi condenado ao pagamento da quantia de R$ 120 mil a quatro pessoas, a título de indenização por danos morais, em razão do falecimento de seu irmão, após ele ter sido liberado pelo médico plantonista do Posto de Saúde do bairro Guanandy. A ação tramitou na 6ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos de Campo Grande.
De acordo com os autos, os autores ingressaram com a ação contra o Município de Campo Grande pretendendo a reparação dos prejuízos experimentados em decorrência do falecimento, ocorrido em agosto de 2007. Na noite de 14 de agosto daquele ano, o paciente sentiu fortes dores no peito, tontura e diarreia, razão pela qual foi conduzido por colegas ao local referido, por volta das 22h40.
O homem era portador de hipertensão arterial, e acreditava apresentar sintomas de infarto. Ele ingeriu o medicamento Captopril que levava consigo, enquanto era conduzido ao posto de saúde. Durante o procedimento de triagem, teve a pressão arterial aferida e, por esta não se apresentar elevada, foi orientado a aguardar atendimento médico.
Conforme relatado no processo, o falecido foi atendido algum tempo depois, após insistência dele e de seus acompanhantes. Mesmo a situação aparentando ser grave, foi liberado pelo médico plantonista, "sem que fosse investigada a origem dos sinais de colapso que lhe foram relatados", apenas com a indicação de medicamentos para tratar labirintite. Ainda em frente ao posto, o irmão desmaiou, tendo uma parada cardiorrespiratória, sendo imediatamente levado à sala de emergências onde, mesmo com os esforços de médicos e enfermeiros para restabelecê-lo, veio a falecer na madrugada do dia seguinte.
Os irmãos, inconformados com a situação, defendem que a administração municipal é civilmente responsável pela reparação dos danos que vieram com o falecimento, considerando que o falecido não teria falecido se os agentes tivessem agido em tempo hábil, com a cautela e a prudência que as circunstâncias exigiam.
Para eles, a morte do familiar foi prematura, o que causou-lhes transtornos e sofrimentos, não só pela ausência do familiar, mas também pelo "descaso e da indiferença do poder público frente à situação". Eles entenderam que a falta de atendimento de qualidade tirou do paciente a oportunidade de sobrevida.
O município, por sua vez, sustentou não existir relação entre o serviço de saúde prestado e a morte, "tendo sido a ele conferida a atenção necessária", pois, quando do atendimento, o paciente não apresentava pressão alta, e, do relato feito à pessoa responsável pela triagem, não constava qualquer menção a dores no peito ou diarreia. A argumentação foi de que a morte decorreu de uma fatalidade, e não de erro médico.
Para a decisão do processo, o juiz José Ale Ahmad Netto entendeu que a situação dos fatos narrados na petição inicial é formada por "um conglomerado de posturas omissivas que, entrelaçadas, sugerem uma prestação deficiente do serviço público". Assim, a responsabilidade civil do Executivo municipal foi analisada mediante aferição da culpa por comportamento imperito, imprudente ou mesmo negligente.
De acordo com o magistrado, a forma como foi exposto o ocorrido indica que a ineficiência do serviço municipal de saúde, não só no que diz respeito aos profissionais responsáveis pelo atendimento, mas quanto aos equipamentos disponíveis para o socorro emergencial, foram determinantes para o óbito do paciente.
Como consta nos autos de indenização, a conduta do médico que atendeu o falecido foi submetida à sindicância e, posteriormente, em processo ético profissional, foi a ele aplicada a pena de censura pública em publicação oficial pelo Conselho Regional de Medicina. Essa medida, segundo o magistrado, reforça a constatação de que a falta de cuidado no atendimento ao paciente foi determinante para o evento lesivo. "A falha do serviço público de saúde, na modalidade mau funcionamento do serviço, está plenamente materializada nos elementos de prova documentais e testemunhais", concluiu José Ale Mahmad Netto, concedendo procedência ao pedido formulado pelos autores para condenar o município de Campo Grande a indenizá-los pelos danos morais experimentados com a morte do irmão.
Processo nº: 0073752-80.2009.8.12.0001
Fonte: TJMS
Marcelo Grisa
Repórter