Depoimento da vítima de assédio tem valor como prova, decide TRT-2


11.02.20 | Trabalhista

 

O depoimento de vítimas de assédio sexual tem grande valor como prova em uma ação judicial, porque, em geral, são praticados na clandestinidade, sem a presença de testemunhas.

O entendimento, consolidado na Justiça penal, foi aplicado pela 15ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) ao manter a decisão por justa causa de um homem acusado de assediar sua colega no ambiente de trabalho.

Na decisão, o relator, juiz convocado Marcos Neves Fava, afirmou, ainda, que há uma cultura machista que causa a prática reiterada do assédio contra a mulher, e ainda põe a culpa na vítima. Esse, segundo juiz, é o caso do processo analisado.

O homem buscou a Justiça para reverter a demissão por justa causa. Em primeira instância, o juiz afastou a justa causa, alegando que houve apenas uma colisão de versão do fato, sem prova da existência do assédio.

A decisão, contudo, foi revista pelo TRT-2, que aplicou o entendimento da justiça penal de que o depoimento da vítima, em caso de assédio, tem caráter de prova. Além disso, o juiz relator considerou que a sindicância interna comprovou que a vítima noticiou os fatos assim que ocorreram e abandonou seu turno no meio do expediente.

O relator ressaltou também que não houve prova do reclamante para demonstrar seu comportamento habitual em desconformidade com a denúncia. “Sua linha de argumentação, na sindicância, foi culpar a vítima, dizendo que ela confidenciou fatos relacionados ao comportamento sexual (como estar afastada do pai do seu filho) e que ela agiu de forma estranha e sem justificativa, porque ele apenas conversou sobre assuntos diversos e lhe ofereceu companhia para o jantar. Configurada, pois, a prática de assédio”.

Cultura machista

No voto, o juiz Marcos Neves Fava afirmou que a submissão da mulher, na sociedade patriarcal ocidental machista, inclui sua exposição mais frequente ao assédio sexual.

"A prática social 'mediana', para não dizer medíocre, ainda reitera padrões de análise e avaliação que desprestigiam a igualdade de gênero e retroalimentam o sistema, para torná-lo ainda mais impermeável à evolução", afirma.

Segundo ele, a prova disso são as observações comuns de que a estuprada estava vestida de forma a convidar o estuprador, de que mulher sozinha não devia frequentar tal tipo de estabelecimento, já sabendo o que lhe caberia, ou que a exibição do corpo patrocina a violência.

"Em semelhante cenário, a mulher inibe-se de procurar auxílio ou punição de seus agressores, temendo a ocorrência da reiteração, da confirmação ou da condenação de que, ao fim e ao cabo, foi agredida porque provocou. O caso dos autos apenas patenteia essa situação", conclui.

Processo: nº1000150-07.2019.5.02.0037

Fonte: Conjur