Para STJ, cláusula de inalienabilidade não impede doação do bem em testamento


09.12.19 | Diversos

Com base nesse entendimento, o colegiado julgou improcedente ação de nulidade de testamento de parte de imóveis gravados, deixados como herança para a companheira, com quem o falecido conviveu durante 35 anos.

​Para a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as cláusulas de inalienabilidade têm duração limitada à vida do beneficiário – seja ele herdeiro, legatário ou donatário –, não se admitindo o gravame perpétuo, transmitido sucessivamente por direito hereditário. Assim, as cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade não tornam nulo o testamento, que só produz efeitos após a morte do testador.

Com base nesse entendimento, o colegiado julgou improcedente ação de nulidade de testamento de parte de imóveis gravados, deixados como herança para a companheira, com quem o falecido conviveu durante 35 anos. De acordo com os autos, em 1970, o pai do falecido deixou para ele oito apartamentos situados em um prédio no Rio de Janeiro. Em decorrência da condição de ébrio habitual do herdeiro, no testamento foram fixadas cláusulas de incomunicabilidade, inalienabilidade e impenhorabilidade dos imóveis, para garantir que o beneficiário não pudesse vender ou doar o patrimônio recebido.

Em 1996, o então dono dos imóveis fez um testamento, deixando parte dos bens herdados para sua companheira. Contudo, depois que ele morreu, seus filhos (netos do testador inicial) entraram com ação de nulidade do testamento, alegando que o documento não teria validade por causa das cláusulas restritivas. Na sentença julgou nulo o testamento por considerar que ele contrariava as restrições registradas em relação aos bens. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) manteve a nulidade sob o argumento de que o testador inicial (avô dos autores da ação) tentou garantir o patrimônio não só ao filho, mas também aos netos. Para o TJRJ, a cláusula de inalienabilidade impede a transmissão dos bens por ato inter vivos.

No recurso apresentado ao STJ, alegou-se que, em se tratando de testamento e sucessão testamentária, não há transmissão de propriedade por ato inter vivos, mas apenas manifestação de vontade, unilateral, para vigorar e produzir efeitos após a morte do testador. O relator do recurso, ministro Antonio Carlos Ferreira, esclareceu que, enquanto o beneficiário dos imóveis estava vivo, os bens se sujeitavam à restrição imposta pelas cláusulas estabelecidas no testamento deixado pelo seu pai. Contudo, após sua morte, tais medidas restritivas perderam a eficácia. 

O ministro afirmou que a jurisprudência do STJ é uníssona no sentido de que a cláusula de inalienabilidade vitalícia tem vigência enquanto viver o beneficiário, passando livres e desembaraçados aos seus herdeiros os bens objeto da restrição. "Por força do princípio da livre circulação dos bens, não é possível a inalienabilidade perpétua, razão pela qual a cláusula em questão se extingue com a morte do titular do bem clausulado, podendo a propriedade ser livremente transferida a seus sucessores", explicou.

Antonio Carlos Ferreira destacou que o testamento é um negócio jurídico que somente produz efeito após a morte do testador, quando ocorre a transferência do bem. Desse modo, "a elaboração do testamento não acarreta nenhum ato de alienação da propriedade em vida, senão evidencia a declaração de vontade do testador, revogável a qualquer tempo". Para o relator, considerando que as cláusulas restritivas vigoraram durante a vida do testador, e que os efeitos do testamento questionado somente tiveram início com sua morte, devem ser consideradas válidas as disposições de última vontade que beneficiaram a sua companheira.

Segundo o ministro Antonio Carlos, o documento em discussão não avançou sobre a legítima dos herdeiros e observou apenas a parte disponível para doação. "Sendo o testador plenamente capaz, a forma prescrita em lei e o objeto lícito, é válido o testamento" – concluiu, dando provimento ao pedido para julgar improcedente a ação anulatória.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

REsp 1641549

 

Fonte: STJ