|   Jornal da Ordem Edição 4.266 - Editado em Porto Alegre em 28.03.2024 pela Comunicação Social da OAB/RS
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ARTIGO

18.05.07  |  José Carlos Teixeira Giorgis   

O eucalipto sedento - Artigo de José Carlos Teixeira Giorgis

Por José Carlos Teixeira Giorgis,
desembagrador aposentado do TJRS. 

Alguém que envelheceu no campo costumava dizer que o mergulho do arado na terra assemelha ao golpe de faca na barriga, como se os sulcos fossem cortes a escancarar vísceras; e que tudo devia ficar no estado virginal que a criação imaginara.

Sem levar a observação ao paroxismo, impõe-se considerar que a continuada agressão aos meios naturais, quase sempre movida por interesses especulativos e com a ruminante passividade dos cidadãos responsáveis, fabrica trágico ambiente para as gerações futuras, predestinadas ao lixo e à sede.

A vocação pastoril das coxilhas gaúchas, sacrificada no altar dos preços e da competição internacional, escapuliu para a sedução do cultivo do trigo, também tragado no banquete da técnica e dos custos; por algum tempo aparentou-se que o sorgo era a redenção, produtores lavraram extensas áreas e submergiram nas dívidas feitas; o soja balança lá e cá, ao sabor dos ventos da concorrência externa; o arroz resiste, mas o valor oscila de modo pendular, sufragado por políticas institucionais perniciosas.      

A novidade na vitrine é o eucalipto, celebrado como a salvação da lavoura decadente e como o salmo milagroso que fará rejuvenescer a economia, recheando de ouro as guaiacas murchas; e tudo com os incentivos governamentais, embora o coro dissonante de vozes competentes que pedem calma no transporte do andor.

As preocupações dos ecologistas, todavia, são absolutamente procedentes, como revela recente artigo do des. Arno Werlang, após retorno de viagem ao estrangeiro e com base em fecundo estudo de fontes jurídicas dos países mais adiantados.

Os trabalhos científicos publicados não deixam dúvidas de que o vegetal afeta o equilíbrio ambiental, pela grave razão de influenciar o ciclo das águas, pois sua disseminação em larga escala compromete a normalidade do lençol freático; a monocultura é ainda negativa para a diversidade dos pequenos seres vivos dos cursos líquidos, reduzindo a decomposição da matéria orgânica vegetal.

Alude-se que conhecido vale mineiro está se tornando improdutivo face a substituição de matas nativas pela plantação indiscriminada de eucalipto: é que dita árvore exótica exige uma apreciável demanda de água, o que esgota a umidade do solo, prejudicando a recarga subterrânea e desestabilizando o mecanismo hidrológico; a  forte absorção dos nutrientes pelas raízes gera um saldo negativo, diminuindo a fertilidade da terra.

Daí não se estranha que em províncias espanholas o cultivo seja inteiramente proibido; e que a legislação portuguesa cuide da questão no catálogo civil material e em regras próprias inflexíveis, pois ali a eucaliptização desenfreada gerou graves danos ao meio e à biodiversidade. 

Assim, quando as trombetas alardearem a abertura das portas do paraíso, e gorjearem mantras de resgate, não é demais o comedimento e reflexão, pois dentro da maçã pode esconder-se algum ogre sedento. 
      
(*) E-mail: [email protected]

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